Mario Sergio Cortella, filósofo, escritor e educador brasileiro, conta que costumava dizer aos seus filhos que, quando completassem 12 anos, lhes desvendaria “o segredo da vida”.
E quando a tão esperada idade chegava, fazia a importante revelação:
– O segredo da vida é que a vaca não dá leite?
– Hã?
– Vaca não dá leite. Você tem de tirar. Você precisa acordar às 4h da manhã, ir ao pasto, entrar no curral cheio de fezes, amarrar o rabo e as pernas da vaca, sentar no banquinho e fazer o movimento certo. Esse é o segredo da vida. Vaca, búfala, cabra não dão leite. Ou você tira, ou não tem leite.
Denise Tonello é Mestra em Educação, Formação de Formadores (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Psicopedagoga (Universidade Cruzeiro do Sul) e Pedagoga (Universidade de São Paulo). Orientadora Educacional e Pedagógica do 1º ciclo do Ensino Fundamental I no Colégio Miguel de Cervantes, Coordenadora do Centro de Formação Saber Mais e Mais, Assessora em escolas particulares de São Paulo, Formadora de professores e Colaboradora no Instituto Avisalá, Fundação Carlos Chagas, PRISMA (Centro de Estudos do Colégio Santa Maria) e Mathema, Colaboradora do grupo Santillana, da Editora Moderna, da Editora Triolet e da Editora Positivo na formação de professores e na produção de materiais didáticos.
Este pequeno “causo” nos leva a pensar que nossas conquistas não são fáceis. Que a felicidade e o alcance de nossos objetivos são resultado de esforço e perseverança. E que a falta de esforço gera frustração, raiva e/ou tristeza.
O desenvolvimento da autonomia pessoal é um objetivo prioritário na educação de um indivíduo. Uma pessoa autônoma é aquela capaz de realizar, por si mesma, tarefas e atividades próprias de alguém da sua idade, a partir da percepção de seu entorno sociocultural. Ser autônomo depende da capacidade do sujeito de imaginar, querer, pensar e, ao mesmo tempo, ter condições para agir e buscar soluções mediante as situações do dia a dia, sejam elas habituais ou adversas.
Assim como a “felicidade”, ser autônomo demanda lidar com dúvidas, erros, superação, esforço, raiva e frustrações. E como ensinamos isso para os nossos filhos?
Não ensinamos… deixamos que eles vivam e enfrentem estes sentimentos legítimos para, então, aprenderem o que é essa tal de “autonomia”. Como no exemplo de que “a vaca não dá leite”, não podemos acreditar que as competências exigidas para a fase adulta irão surgir, como leite na caixinha… Há várias habilidades que precisamos desenvolver ao longo da infância e adolescência para que possamos nos tornar adultos competentes.
A construção da autonomia respeita um processo que envolve o desenvolvimento emocional e afetivo da criança, bem como a elaboração do seu mundo interno. Nesse sentido, o papel dos adultos deve ser o de proporcionar situações que possibilitem a independência em hábitos do dia a dia, o cuidado com seus pertences e a tomada de decisões em situações em que ela possa fazer algum tipo de escolha. Uma criança que cresce com pouca autonomia, deixa de desenvolver habilidades importantes à escolaridade e vida adulta.
Talvez possa parecer uma constatação óbvia, mas, uma vez que “ser autônomo” depende da criação de hábitos que devem ser cultivados desde a mais tenra idade, o que estamos fazendo para contribuir diariamente com tal aprendizado?
Um dos objetivos da escola, por exemplo, é desenvolver o papel de estudante. Neste sentido consideramos que um estudante competente é aquele que organiza os próprios materiais, realiza as atividades solicitadas, se antecipa, tem iniciativas para buscar conhecimento, cumpre com os prazos estipulados, participa das aulas e, o mais importante, constrói o conhecimento de maneira autônoma, percebendo-se responsável por isto.
Porém, não podemos esperar que nossos filhos sejam “bons estudantes” se não os ajudamos a desenvolver as habilidades necessárias desde a Educação Infantil. Nosso papel, portanto, é pensar como estimulá-los a organizar-se, realizar as propostas, fazer antecipações, ter iniciativa, participar e construir conhecimento, sempre de maneira AUTÔNOMA, como agentes ativos e responsáveis por seus objetivos.
Para desenvolver “essa tal de autonomia” é preciso ensinar as crianças a enfrentar o mundo real, aceitando as circunstâncias e lidando com elas de maneira positiva. É preciso ensinar a lidar com as frustrações legítimas que surgem quando não vemos nossas expectativas realizadas. É preciso educar para que a criança vá desenvolvendo a maturidade necessária para reconhecer seus limites e suas limitações e também a dos outros. É preciso educar para o autocontrole, para a paciência, para a espera e para a tolerância. Enfim, é preciso educar para o que há por vir, sem querer poupá-los ou evitar qualquer sofrimento.
Com o humor de sempre, Denise nos oferece um texto conciso e claro para pensar a “ tal da autonomia” junto a pais e/ou educadores.
Obrigada, Sonia!